“A reputação de que goza a CMP Wagner (Private MiIitary Company Wagner) junto dos nossos jovens, especialmente os que gostariam de combater, encontra-se em alta. Assim, durante as últimas semanas, recebemos insólitos pedidos de informação jurídica sobre os direitos de que gozam os mercenários, na eventualidade de serem presos, ou de sofrerem ferimentos graves, ou mesmo de morte, e se o dinheiro auferido deve ser declarado fiscalmente, ou como poderão compensar os seus familiares mais próximos.
Os mercenários existiram abundantemente na Antiguidade Clássica. Alexandre, o Grande, por exemplo, para além do exército regular, dispunha de mercenários, ou seja, tinha ao seu serviço homens de várias etnias, oriundos do seu extensíssimo império, destinados a missões particularmente brutais, a troco de «merces» (concessões, indultos, retribuições), palavra latina já surgida no tempo dos Romanos, de múltiplos significados, de entre as quais o saque era, de longe, a mais preferida, cabendo a sua definição e limites aos próprios soberanos contratantes e a imposição da disciplina aos seus comandantes (Polemarco, no caso Grego, Centurião, no caso Romano). Se, durante as pilhagens, algum mercenário desobedecesse e deitasse mão a mais do que devia, passava-se imediatamente, e «in loco», à sua empalação pura e simples.
O grande modelo de inspiração dos chamados mercenários atuais reside nos «condottiere», grupo militar privado de origem italiana especialista em táticas e estratégias de guerra nos séculos XIV e XVI, incorporando transalpinos, mas também suíços, alemães e ingleses. Marcaram profundamente a História italiana da Idade Média até ao Renascimento, merecendo, em 1513, da parte de Maquiavel, as maiores reservas ao alertar os príncipes para os riscos de «chantagem e até de rebeliões» que corriam ao contratá-los.
É muito difícil, senão mesmo impossível, comparar o mercenariato contemporâneo à luz do passado, porquanto, as condições históricas não são as mesmas. Há, todavia, alguns pontos de contacto que nos permitem estabelecer umas quantas semelhanças com o que, sem dúvida, marcou a arte da guerra antiga e os seus intervenientes até à eclosão do primeiro conflito mundial (1914-18).
Temos o exemplo da Legião Estrangeira francesa, tropa antigamente composta só por estrangeiros sob o comando de oficiais franceses. E a sua congénere espanhola, que, salvo um ou outro pormenor, era muito semelhante. Hoje, ambas surgem completamente integradas nas respetivas forças armadas nacionais. A Legião Estrangeira francesa tem, no entanto, a particularidade de proceder à contratação dos seus elementos à boa maneira daquele país, conferindo-lhes regalias tais como segurança social, seguros de saúde e de vida, normalmente um contrato escrito pelo período inicial de cinco anos, renováveis, incluindo alojamento, alimentação, vestuário e equipamento militar, e, claro, o direito a pelo menos 45 dias de licença por ano e um soldo a partir de 2.000 euros mensais, beneficiando ainda de prémios e subsídios de acordo com o tipo de missão.
“A reputação de que goza a CMP Wagner (Private MiIitary Company Wagner) junto dos nossos jovens, especialmente os que gostariam de combater, encontra-se em alta. Assim, durante as últimas semanas, recebemos insólitos pedidos de informação jurídica sobre os direitos de que gozam os mercenários, na eventualidade de serem presos, ou de sofrerem ferimentos graves, ou mesmo de morte, e se o dinheiro auferido deve ser declarado fiscalmente, ou como poderão compensar os seus familiares mais próximos.
Os mercenários existiram abundantemente na Antiguidade Clássica. Alexandre, o Grande, por exemplo, para além do exército regular, dispunha de mercenários, ou seja, tinha ao seu serviço homens de várias etnias, oriundos do seu extensíssimo império, destinados a missões particularmente brutais, a troco de «merces» (concessões, indultos, retribuições), palavra latina já surgida no tempo dos Romanos, de múltiplos significados, de entre as quais o saque era, de longe, a mais preferida, cabendo a sua definição e limites aos próprios soberanos contratantes e a imposição da disciplina aos seus comandantes (Polemarco, no caso Grego, Centurião, no caso Romano). Se, durante as pilhagens, algum mercenário desobedecesse e deitasse mão a mais do que devia, passava-se imediatamente, e «in loco», à sua empalação pura e simples.
O grande modelo de inspiração dos chamados mercenários atuais reside nos «condottiere», grupo militar privado de origem italiana especialista em táticas e estratégias de guerra nos séculos XIV e XVI, incorporando transalpinos, mas também suíços, alemães e ingleses. Marcaram profundamente a História italiana da Idade Média até ao Renascimento, merecendo, em 1513, da parte de Maquiavel, as maiores reservas ao alertar os príncipes para os riscos de «chantagem e até de rebeliões» que corriam ao contratá-los.
É muito difícil, senão mesmo impossível, comparar o mercenariato contemporâneo à luz do passado, porquanto, as condições históricas não são as mesmas. Há, todavia, alguns pontos de contacto que nos permitem estabelecer umas quantas semelhanças com o que, sem dúvida, marcou a arte da guerra antiga e os seus intervenientes até à eclosão do primeiro conflito mundial (1914-18).
Temos o exemplo da Legião Estrangeira francesa, tropa antigamente composta só por estrangeiros sob o comando de oficiais franceses. E a sua congénere espanhola, que, salvo um ou outro pormenor, era muito semelhante. Hoje, ambas surgem completamente integradas nas respetivas forças armadas nacionais. A Legião Estrangeira francesa tem, no entanto, a particularidade de proceder à contratação dos seus elementos à boa maneira daquele país, conferindo-lhes regalias tais como segurança social, seguros de saúde e de vida, normalmente um contrato escrito pelo período inicial de cinco anos, renováveis, incluindo alojamento, alimentação, vestuário e equipamento militar, e, claro, o direito a pelo menos 45 dias de licença por ano e um soldo a partir de 2.000 euros mensais, beneficiando ainda de prémios e subsídios de acordo com o tipo de missão.
Excluindo o caso francês, os mercenários atuais são empregados de empresas militares ou de segurança privada, quase sempre sedeadas em paraísos fiscais, embora possam ter escritórios de representação em diferentes países. Como qualquer outra empresa, têm sócios de capital (investidores) e órgãos de gestão. Usualmente, um ex-oficial superior aparece como vogal executivo do conselho de administração ou mesmo seu presidente. O soldo, no privado, tem componentes muito variáveis dependendo do país, da empresa, da missão e dos riscos envolvidos. Quem trabalha em conflitos globais em África, na América Latina e na Europa Oriental, ganha entre os 2.000 e os 50.000 dólares mensais.
Os mercenários/empregados da CMP Wagner mobilizados na Ucrânia, Síria e países africanos são recrutados, principalmente, entre veteranos do exército regular e o soldo que auferem ronda os 2.000 dólares mensais. Por seu turno, as empresas com origem nos EUA ou na Europa oferecem serviços de segurança e resgate na Ucrânia e cobram entre 50 mil e 6 milhões de dólares por missão, dependendo da complexidade e do número de operacionais mobilizados.
No que respeita a contratações, os mercenários/empregados atuais costumam receber, pelo menos, uma soldada antecipada (três meses de pré) e a modalidade adotada é um misto que inclui moeda-papel (euros ou dólares), moeda virtual e transferências eletrónicas, seja através da aplicação Revolut ou PayPal, seja através de depósitos em contas situadas em países considerados seguros.
Um mercenário/empregado português que pretenda declarar o dinheiro que recebeu apenas terá essa obrigação se ainda for residente em Portugal. Nesse caso, terá de abrir atividade fiscal como segurança/militar privado, e passará a ser tributado, como trabalhador independente, pela Categoria B.
As leis internacionais, com muitas limitações que «protegem» os mercenários/empregados de guerra ou aqueles que se consideram ser apenas seguranças, fazem parte do Direito Internacional Humanitário (DIH), composto principalmente pelos tratados internacionais, expressamente reconhecidos pelos Estados litigantes, pelo costume internacional, como prova de uma prática geral aceite como direito e pelos princípios gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas.
Estes militares, tal como os regulares, também enfrentam riscos, pois podem ser capturados, torturados ou mortos pelos seus inimigos. Porém, o que nunca poderá acontecer a um militar regular é ser deixado para trás pelos seus camaradas, o mesmo já não se verificando com os mercenários/empregados, muitas vezes abandonados à sua sorte, feridos nos teatros de guerra pelos seus empregadores.
As Convenções de Genebra de 1949 e os seus Protocolos Adicionais são tratados internacionais que estabelecem os direitos e deveres das partes em conflito, bem como as sanções a aplicar nos casos de violações graves. A proteção internacional é escassa porque, embora esta profissão exista desde que existem guerras, ainda continua a ser debatida e regulamentada a questão ética e legal dos chamados militares sem bandeira.
Estipula o artigo 3.º das Convenções de Genebra (1949) o seguinte: em qualquer conflito, seja internacional ou não internacional, «aqueles que estão fora de combate devido a doença, ferimentos, detenção ou qualquer outra causa, serão tratados com humanidade em todas as circunstâncias, sem qualquer distinção desfavorável baseada em raça, cor, religião ou fé, sexo, nascimento ou riqueza, ou qualquer outro critério semelhante».
Independentemente das limitações, o sistema de socorro às vítimas, sejam elas civis ou militares, assenta na intervenção da Cruz Vermelha e no seu mandato humanitário de as proteger e assistir nos conflitos armados, através do seu Comité Internacional, que é uma organização neutra e independente, ou através do seu equivalente islâmico, o Crescente Vermelho.
O escritor e correspondente de guerra Jean Lartéguy, (autor, entre outros, do notável “best-seller” Os Centuriões), talvez quem melhor soube escrever sobre os mercenários, deixou-nos estas palavras:
«Que eu saiba, nenhum mercenário se enquadra na definição dada pelo Dicionário Larousse: ‘’soldado que serve um governo estrangeiro por dinheiro’’. Os mercenários que conheci – e foram muitos – e cuja vida às vezes compartilhei, lutam durante vinte a trinta anos para refazer o mundo. Até à idade dos quarenta, lutam pelos seus sonhos e por uma imagem de si próprios que inventaram para eles. Depois, se não tombarem para sempre nos campos de batalha, resignam-se a viver como todos nós – mas mal, porque não têm direito a reforma – e morrem nas suas camas de congestão cerebral ou de cirrose hepática. O dinheiro nunca lhes interessa, a glória raramente, e importam-se muito pouco ou mesmo nada com a opinião pública. É nisso, e sobretudo nisso, que eles diferem dos outros homens.»”
Excluindo o caso francês, os mercenários atuais são empregados de empresas militares ou de segurança privada, quase sempre sedeadas em paraísos fiscais, embora possam ter escritórios de representação em diferentes países. Como qualquer outra empresa, têm sócios de capital (investidores) e órgãos de gestão. Usualmente, um ex-oficial superior aparece como vogal executivo do conselho de administração ou mesmo seu presidente. O soldo, no privado, tem componentes muito variáveis dependendo do país, da empresa, da missão e dos riscos envolvidos. Quem trabalha em conflitos globais em África, na América Latina e na Europa Oriental, ganha entre os 2.000 e os 50.000 dólares mensais.
Os mercenários/empregados da CMP Wagner mobilizados na Ucrânia, Síria e países africanos são recrutados, principalmente, entre veteranos do exército regular e o soldo que auferem ronda os 2.000 dólares mensais. Por seu turno, as empresas com origem nos EUA ou na Europa oferecem serviços de segurança e resgate na Ucrânia e cobram entre 50 mil e 6 milhões de dólares por missão, dependendo da complexidade e do número de operacionais mobilizados.
No que respeita a contratações, os mercenários/empregados atuais costumam receber, pelo menos, uma soldada antecipada (três meses de pré) e a modalidade adotada é um misto que inclui moeda-papel (euros ou dólares), moeda virtual e transferências eletrónicas, seja através da aplicação Revolut ou PayPal, seja através de depósitos em contas situadas em países considerados seguros.
Um mercenário/empregado português que pretenda declarar o dinheiro que recebeu apenas terá essa obrigação se ainda for residente em Portugal. Nesse caso, terá de abrir atividade fiscal como segurança/militar privado, e passará a ser tributado, como trabalhador independente, pela Categoria B.
As leis internacionais, com muitas limitações que «protegem» os mercenários/empregados de guerra ou aqueles que se consideram ser apenas seguranças, fazem parte do Direito Internacional Humanitário (DIH), composto principalmente pelos tratados internacionais, expressamente reconhecidos pelos Estados litigantes, pelo costume internacional, como prova de uma prática geral aceite como direito e pelos princípios gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas.
Estes militares, tal como os regulares, também enfrentam riscos, pois podem ser capturados, torturados ou mortos pelos seus inimigos. Porém, o que nunca poderá acontecer a um militar regular é ser deixado para trás pelos seus camaradas, o mesmo já não se verificando com os mercenários/empregados, muitas vezes abandonados à sua sorte, feridos nos teatros de guerra pelos seus empregadores.
As Convenções de Genebra de 1949 e os seus Protocolos Adicionais são tratados internacionais que estabelecem os direitos e deveres das partes em conflito, bem como as sanções a aplicar nos casos de violações graves. A proteção internacional é escassa porque, embora esta profissão exista desde que existem guerras, ainda continua a ser debatida e regulamentada a questão ética e legal dos chamados militares sem bandeira.
Estipula o artigo 3.º das Convenções de Genebra (1949) o seguinte: em qualquer conflito, seja internacional ou não internacional, «aqueles que estão fora de combate devido a doença, ferimentos, detenção ou qualquer outra causa, serão tratados com humanidade em todas as circunstâncias, sem qualquer distinção desfavorável baseada em raça, cor, religião ou fé, sexo, nascimento ou riqueza, ou qualquer outro critério semelhante».
Independentemente das limitações, o sistema de socorro às vítimas, sejam elas civis ou militares, assenta na intervenção da Cruz Vermelha e no seu mandato humanitário de as proteger e assistir nos conflitos armados, através do seu Comité Internacional, que é uma organização neutra e independente, ou através do seu equivalente islâmico, o Crescente Vermelho.
O escritor e correspondente de guerra Jean Lartéguy, (autor, entre outros, do notável “best-seller” Os Centuriões), talvez quem melhor soube escrever sobre os mercenários, deixou-nos estas palavras:
«Que eu saiba, nenhum mercenário se enquadra na definição dada pelo Dicionário Larousse: ‘’soldado que serve um governo estrangeiro por dinheiro’’. Os mercenários que conheci – e foram muitos – e cuja vida às vezes compartilhei, lutam durante vinte a trinta anos para refazer o mundo. Até à idade dos quarenta, lutam pelos seus sonhos e por uma imagem de si próprios que inventaram para eles. Depois, se não tombarem para sempre nos campos de batalha, resignam-se a viver como todos nós – mas mal, porque não têm direito a reforma – e morrem nas suas camas de congestão cerebral ou de cirrose hepática. O dinheiro nunca lhes interessa, a glória raramente, e importam-se muito pouco ou mesmo nada com a opinião pública. É nisso, e sobretudo nisso, que eles diferem dos outros homens.»”